domingo, 24 de outubro de 2010

SEXUALIDADE

A Síndrome de Don Juan



Fica mais difícil entender os novos tempos, quando consideramos que as expressões ficar com... e sair com... significam a mesma coisa, apesar dos termos ficar e sair serem antagônicos.

Donjuanismo é uma expressão em desuso que veio à tona há algum tempo, depois do filme Don Juan de Marco, com Marlon Brando e Johnny Depp. O filme Don Juan de Marco foi escrito e dirigido por Jeremy Leven.

Don Juan é um personagem literário tido como símbolo da libertinagem. O primeiro romance com referência ao personagem foi a obra El Burlador de Sevilla, de 1630, do dramaturgo espanhol Tirso de Molina. Posteriormente Don Juna aparece em José Zorrilla com a estória de Don Juan Tenorio. A figura de Don Juan foi também cultuada na música, em obras de Strauss e Mozart, este último com a ópera Don Giovanni, composta em 1787. Outro paradigma do eterno sedutor é a figura de Casanova, conhecida pela autobiografia do veneziano Giovanni Jacopo Casanova.

Mas a figura do eterno sedutor continua atrelada à Don Juan, que aparece ainda na obra de Molière, em Le Festin de Pierre, no poema satírico de Byron chamado simplesmente Don Juan, no drama de Bernard Shaw, chamado Man and Superman.

Segundo Jung, para quem qualquer forma de arte, assim como os mitos, são veículos para a expressão do inconsciente coletivo, Don Juan pode representar nossos arquétipos (Walter Boechat - veja mais sobre o filme).Trata-se de um padrão de personalidade caracterizado por uma pessoa narcisista, enamorada , inescrupulosa, amada e odiada e que faz tudo valer para a conquista de uma mulher.

O donjuanismo representa um protótipo particular de comportamento humano, classificação esta estribada particularmente em valores culturais e morais. Não existe essa denominação no CID.10 ou DSM.IV, mas isso não significa, absolutamente, que pessoas assim deixam de existir.

Independente das interpretações psicanalíticas sobre o filme Dom Juan de Marco, interessa aqui apenas caracterizar um tipo de conduta atual; a inclinação que as pessoas têm para liberdade sexual explícita. A característica principal do que se pode chamar hoje de donjuanismo, seria uma forte compulsão para sedução, entretanto essa ocorrência não é isolada nem única na personalidade da pessoa, mas reflete sim uma estrutura social e comportamental especial.

Descreve-se o donjuanismo como uma personalidade que necessita seduzir o tempo todo, que aparentemente se enamora da pessoa difícil mas, uma vez conquistada, a abandona. As pessoas com esse traço não conseguem ficar apegados a uma pessoa determinada, partindo logo em busca de novas conquistas. As pessoas com essas características são os anarquistas do amor (Sapetti), tornando válidos quaisquer meios para conquistar, entretanto, os entimentos da outra pessoa não são levados em conta. Aliás, Foucault enfatiza essa questão ao dizer que Don Juan arrebenta com as duas grandes regras da civilização ocidental, a lei da aliança e a lei do desejo fiel.

Em psiquiatria clínica, entretanto, a despeito do aspecto contestador que Foucault quer ver nessa atitude, o desprezo para com o sentimento alheio pode ser critérios para o diagnóstico de Sociopatia ou Personalidade Anti-Social. Para o donjuan só interessa o instante do prazer e o triunfo sobre sua conquista, principalmente quando a presa de seu interesse tem uma situação civil proibida (casada, freira, irmã ou filha de amigo, etc).

Normalmente essas pessoas ignoram a decência e a virtude moral mas seu papel social tenta mostrar o contrário; são eminentemente sedutores. Sobre essa característica o escritor Carlos Fuentes, alega ao seu Don Juan a frase: "Porque nenhuma mulher me interessa se não tiver um amante, marido, confessor ou Deus, ao qual pertença ...".

O aspecto de desafio mobiliza o donjuan, fazendo com que a conquista amorosa tenha ares de esporte e competição, muitas vezes convidando amigos para apostas sobre sua competência em conquistar essa ou aquela mulher. Não é raros que esses conquistadores tragam listas e relações das mulheres conquistadas, tal como um troféu de caça.

Por outro lado, segundo Kaplan, deve haver significativos sentimentos homossexuais latentes desses indivíduos. Esse autor considera que, levando para a cama a mulher de outro, o donjuan estaria inconscientemente se relacionando com o marido, motivo maior de seu prazer. Tanto que é maior o prazer quanto mais expressivo é o marido ou namorado traído.

O narcisismo (traço feminóide) dessas pessoas é uma das características mais marcantes, ao ponto delas amarem muito mais a si mesmas que a qualquer outra pessoa conquistada. Outros autores acham o donjuanismo um excesso do complexo de Édipo, ou fixação na mãe, já que muitos deles não constituem família com nenhuma de suas conquistas e acabam vivendo para sempre com suas mães.

Nos casos mais sérios a inclinação à sedução pode adquirir caráter de verdadeira compulsão, tal como acontece no jogo patológico. De certa forma, a conquista compulsiva do Donjuan serve-lhe para melhorar sua sensação de segurança e auto-estima, entretanto, uma vez possuído o que desejava, já não o deseja mais. Em alguns casos o Donjuan começa a se desestimular com a conquista, quando percebe que a mulher conquistada já está apaixonada por ele, ou ainda, pode nem haver necessidade do ato sexual a partir do momento em que ele percebe que a mulher aceita e deseja o sexo com ele. Por outro lado, se a mulher é indiferente ou não cede à sua sedução, o Donjuan se torna mais obstinado ainda.

Não será totalmente lícito dizer, como dizem alguns, que o Donjuan se diverte com o sofrimento alheio. Na realidade parece mais que seja insensível ao sentimento alheio do que tenha prazer com ele. De fato, parece que eles não experimentam com o amor o mesmo tipo de sentimento que as demais pessoas. O amor neles é um sentimento fugaz, passageiro e que, continuadamente, tem o objeto alvo renovado. Se algum déficit pode ser apurado na personalidade do Donjuan, este se dá no controle da vontade.

Apesar dessa compulsão à sedução, isso não significa que a pessoa portadora de donjuanismo seja, obrigatoriamente, mais viril ou mais ativo sexualmente. A contínua sedução do donjuan nem sempre se dá às custas de um eventual desempenho sexual excepcional mas sim, devido à habilidade em oferecer sempre às mulheres tudo aquilo que elas mais estão querendo. Nesse sentido, todos eles são sempre muito inconstantes, desempenham papeis sociais sempre teatrais e exclusivamente dirigidos à satisfação de suas conquistas, por isso fazem sempre o tipo "príncipe encantado", tão cultuado pelo público feminino. Eles têm habilidade em perceber rapidamente os gostos e franquezas de suas vítimas e, são igualmente rápidos em atender as mais diversas expectativas.

Há quem considere como uma das características fundamentais da personalidade do donjuan uma acentuada imaturidade afetiva. O aspecto volúvel e responsável pela constante troca de relacionamento pode ser indício dessa imaturidade afetiva e indica, sobretudo, uma completa carência de responsabilidade ou medo de assumir os compromissos normais das pessoas maduras (casamento, família, filhos, etc.).

"Ficar com..."

"Ficar com...", "sair com...", "namorix", são termos atualmente usados para designar a atitude de se relacionar sexualmente (com penetração sexual ou não), fortuitamente, fugazmente e sem nenhum compromisso de continuidade. Este relacionamento é fortuito porque não implica, obrigatoriamente, em nenhuma combinação ou contrato prévio, é fugaz devido à provisoriedade da união. Não há compromisso de continuidade porque, ao menor sinal de interesse de um dos envolvidos no sentido de continuar, a relação se desfaz e é evitada (diz-se que fulano(a) não é legal porque pega no pé). Nessa nova modalidade de relacionamento não há envolvimento amoroso, não há cobrança de compromisso e os objetivos se concretizam e se esgotam no orgasmo ou na despedida, normalmente com satisfação bilateral.

A mulher começou a expandir significativamente sua sexualidade depois da disseminação do uso da pílula anticoncepcional, nas décadas de 60-70, e a inconseqüência sexual que antes era monopólio dos homens, também passou a ser experimentada por ela. Descobriu-se que o prazer podia ser bilateral e, a partir daí, deixou-se de falar que fulano se aproveitou de fulana; ambos se aproveitam.

A atitude de "Ficar com..." é diferente daquilo que se entende por donjuanismo porque não implica numa verdadeira conquista. "Ficar com..." é uma afinidade recíproca, e um não conquista o outro porque ambos estão, decididamente, com o mesmo objetivo em mente.

Se no donjuanismo a insensibilidade e menosprezo para com o sentimento alheio são a marca do diagnóstico, "ficar com..." implica, em essência e caracteristicamente, na ausência de sentimentos mais profundos de ambas as partes. Assim sendo, não havendo sentimentos profundos, não há o que menosprezar.

Conseqüentemente e decididamente, entre a população adepta do "ficar com..." não há espaço para o Donjuan. Nesse meio ele não encontra sua presa, já que as mulheres não preenchem os requisitos de candidatas. Aqui as mulheres, como se diz, estão a fim, não costumam ser comprometidas, não são conquistadas, uma vez que o conluio é também o objetivo delas, portanto, a compulsão do Don Juan se desfaz ante a ausência do desafio.

Donjuanismo Feminino

Mas, mesmo com a moda do "ficar com..." e com a maior liberalidade feminina o donjuanismo não desapareceu. Antes disso, atualmente já pode ser possível observá-lo entre as mulheres. Embora num campo da ação muito mais restrito, o donjuanismo continua fazendo suas vítimas sentimentais; agora, femininas e masculinas.

Não há designação satisfatória para descrever a mulher que preenche os requisitos do donjuanismo, mas elas existem indubitavelmente. São também pessoas movidas pela compulsão da conquista do outro, pela inclinação ao relacionamento impossível, seja com homens mais velhos ou muito mais novos, casados, padres, enamorados de outras mulheres, enfim, pessoas que oferecem alguma condição de desafio.

No donjuanismo feminino, tanto quanto no masculino, não há necessidade invariável de concluir a conquista através do ato sexual. Basta a mulher perceber que o objeto da conquista está, digamos, aos seus pés, que a motivação para continuar o relacionamento se desvanece.

Fonte: http://virtualpsy.locaweb.com.br/index.php?art=86&sec=23

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